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Não deixe de ler o Conto: "O Turra Mussolé", publicado no dia 7 de Setembro de 2008, o qual, ao cabo de 34 anos da chamada "Revolução dos Cravos" sofreu CENSURA por parte do Ministério da Defesa Nacional, levando-me a deixar de escrever no Jornal da APOIAR - Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas de Stresse de Guerra.


"MENINA DOS OLHOS TRISTES" CANTADO POR ADRIANO CORREIA DE OLIVEIRA

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domingo, 5 de outubro de 2008

Contos da Guerra Colonial

A toda(o)s aquela(e)s que fazem o favor de me privilegiarem com as suas visitas informo que as novas publicações encontram-se no blogue:

Contos da Guerra Colonial II

beijos
abraços
saudações bloguistas

terça-feira, 16 de setembro de 2008

ENCERRADO PARA OBRAS

ESTE ESPAÇO ENCONTRA-SE TEMPORARIAMENTE SUSPENSO.
OBRIGADO PELA VISITA.
SAUDAÇÕES BLOGUISTAS.

domingo, 7 de setembro de 2008

O "TURRA MUSSOLÉ"

Este conto é dedicado a uma colega da blogosfera, pessoa que, não conhecendo pessoalmente, já me merece a maior estima e admiração: a Susana B. (blogue: Palavras que me tocam).
Foi o meu segundo trabalho literário censurado após a "Revolução dos Cravos", desta vez não a lápis azul (prática da polícia política PIDE-DGS) mas a caneta de feltro amarelo fluorescente.


O "TURRA MUSSOLÉ"


Mussolé era um nome temido tanto pelas tropas portuguesas como pela população nativa que, obrigatoriamente, lhe dava abrigo. Havia pertencido a um grupo de combate integrado no nosso exército como GE (Grupos Especiais), porque, não combatendo por idealismo, o seu lugar era junto daqueles que lhe proporcionavam mais regalias. Integrava, dado o seu prestígio junto das populações, um grupo de guerrilheiros, havendo-lhe sido atribuído um cargo de chefia. O comandante supremo do seu destacamento nómada naquela zona do leste de Angola era um português, ex-alferes miliciano e com ele movimentavam-se dois ou três cubanos e um chinês. Paradoxalmente, ou talvez não - aquela guerra também se sustentava assim - o senhor alferes, pertencente a uma família abastada, havia-se passado para o outro lado e, pasmem-se os mais incrédulos, recebia e emitia a sua correspondência para a Metrópole através da PIDE-DGS !?...
Certo dia assisti a um recrutamento e selecção desses GE's. Foi colocada uma mesa rectangular ao ar livre junto à tenda do Comando, ficando sentado ao centro o alferes-médico, ladeado por um enfermeiro e pelo cabo escriturário. Os nativos aguardavam ansiosos, de pé, em fila indiana e iam sendo submetidos a um interrogatório e inspecção médica sumários. Daquele colectivo quem decidia quanto à aptidão ou não era o médico. Chegada a vez do interrogatório a um negro de aspecto robusto e convencido, e mesmo antes de preenchidos os quesitos pelo cabo escriturário, o alferes-médico olhou-o muito fixamente, estranhando o facto dele usar uns óculos de armação dourada tipo Ray-Ban com lentes de vidro translúcidas mas visivelmente sem graduação. O médico, já experimentado com situações análogas, conteve o sorriso e, já prevendo a resposta, perguntou-lhe de forma inquisitória:
- O teu nome? Quem é que receitou esses óculos ao meu amigo? Essas lentes são graduadas?
O negro sorriu e respondeu timidamente:
- Chamô-me Zé, sinhor dotori. Os óculis são p' a dar catagoria!
A resposta provocou uma risada por parte daqueles que assistiam à selecção. À semelhança do que acontecia com Mussolé, também neste negro estava arreigada a convicção de que serem militares ou guerrilheiros, ostentarem uns óculos, possuírem uma bicicleta e um rádio transistorizado eram sinais exteriores de riqueza e de promoção social, tornando-os, assim, alvo da preferência de muitas mulheres e prestigiados junto das outras pessoas.
Um dia, Mussolé foi denunciado por um marido traído, informando os militares da presença do perigoso terrorista na sua cabana, "comendo mulher e comendo a comida". Foi imediatamente emboscado e feito prisioneiro juntamente com outro camarada de deserção. Foram amarrados com cordas à volta dos pulsos e das pernas e arrastados para um cubículo contíguo à enfermaria do aquartelamento. Alí aguardariam a chegada do senhor inspector da PIDE, o qual se encontrava no gozo dumas curtas férias em Luanda. Era a ele que competia interrogar, torturar, mandar matar, enfim, decidir da sorte daqueles dois guerrilheiros terroristas. Sabia-se, contudo, que o mais certo seria a libertação, dada a ligação existente entre eles e o tal grupo misto.
Não era necessário ser-se muito inteligente para se perceber que qualquer polícia, mesmo a tenebrosa, omnipotente e omnipresente polícia política, obtinha os seus frutos ao nível da investigação, a troco de algumas facilidades concedidas aos seus informadores...
O cabo enfermeiro sabia-o perfeitamente. Mas tinha "um pó desgraçado" aos terroristas e custava-lhe aceitar que tal acontecesse. Era conhecido pelo seu sadismo, pelas suas práticas cirúrgicas a sangue-frio realizadas de forma artesanal mesmo aos seus camaradas quando feridos. Tinha no seu currículo um vasto rol de atrocidades cometidas ao inimigo. E o inimigo, no seu ignorante entendimento, eram todos aqueles de raça negra, os quais considerava como animais selvagens, sem alma, independentemente do sexo ou idade.
Durante uma operação em que detectaram um aglomerado populacional, os próprios camaradas ficaram chocados com a sua crueldade, e eu ainda guardo uma fotografia do cadáver duma menina com aproximadamente dez anos de idade que, prostrada de joelhos, lhe implorava, chorando:
- Shindel (branco) não mata! Shindel não mata!
O cabo Miranda, de pé, com a G-3 apontada àquela criança indefesa e suplicando por misericórdia, arregalou os seus olhos verdes de felino enraivecido, esboçou na sua boca imunda um sorriso do tamanho dum cano de esgoto, e gozou à brava com aquele orgasmo pedófilo, ejaculando balas de 7,62 milímetros naquele corpinho virgem e desprotegido.
Numa outra operação em que foram dizimadas todas as criaturas encontradas, sugeriu ao comandante do pelotão (coitado, era um banana e temia-o) que preservasse uma negra alta e com um rosto e um corpo lindos, pois tinha um plano em mente que decerto iria ser do contentamento geral. Eram, salvo erro, catorze homens cansados, mal alimentados e suados, mas também perturbados. Contudo, restavam-lhes ainda forças para misturarem a sujidade mental à promiscuidade do acto que ninguém hesitou praticar. Aquela mulher negra e bela ali ficou deitada, nua, de barriga para o ar, com as pernas bem abertas e flectidas. Apenas lhe restava esperar. Fechou os olhos e voltou a cabeça para o lado. Duvido que tenha sentido a penetração dos treze monstros saltitantes. O décimo quarto e último foi o cabo enfermeiro, o qual iria desferir o golpe de misericórdia, libertando aquela bela fêmea negra do sofrimento causado pela bárbara violação colectiva.
Com a mente tão ranhosa quanto o seu membro viril, atirou-se para cima dela e "carinhosamente" manteve inerte a sua faca de mato sustentando-a com o punho contra o seu peito enquanto a ponta afiada se comprimia entre os enormes e bem machucados seios viscosos da vítima. Tombou arfando sobre ela, ejaculou a imundície contida nos seus testículos e deliciou-se enquanto se foi esfregando no sangue quente que ia jorrando e escorrendo entre os dois corpos.
No dia seguinte ao do aprisionamento de Mussolé e do seu companheiro tivemos conhecimento de que o inspector Brotas estaria de regresso. Durante o arrastamento dos prisioneiros até ao cubículo, um deles havia espetado um pedaço de madeira nas costas e foi pedido ao cabo Miranda que o tratasse. Foi para ele um prazer efectuar tal operação. Com o auxílio da faca de mato, sem qualquer anestésico, retirou-lhe o objecto estranho, provocando-lhe uma hemorragia. Aplicou-lhe uma compressa embebida em urina e um trapo bem apertado à volta do tronco. Nessa noite, o cabo Miranda, em conluio com outro soldado racista, arquitectou um maquiavélico estratagema para livrarem definitivamente da dor o Mussolé e o seu companheiro. E preservarem, sobretudo, os terroristas da proximidade com o malvado inspector da PIDE, que estava de regresso. O tempo urgia. Deixaram a porta do cubículo ligeiramente aberta, fingindo esquecimento, enquanto aguardaram impacientes o desenrolar dos acontecimentos. Tal como haviam previsto, os prisioneiros, ao darem conta da imprudente distracção dos carcereiros, abriram a porta lenta e cautelosamente, espreitaram para o exterior e intentaram a fuga. Não estava ninguém por perto. Era a hora de os oficiais e sargentos estarem a jogar e a beber, o mesmo acontecendo com os restantes militares. A fuga apresentava-se fácil. Saíram vagarosamente na direcção da sanzala. As rajadas inopinadas assustaram-nos. Todos os militares acorreram ao local, abandonando o jogo e as bebidas em cima das mesas. Cá fora, também o jogo do gato e do rato havia terminado. Obviamente, com a exterminação dos últimos em consequência da emboscada montada pelos caçadores furtivos.

Nota: Os nomes relatados neste texto são fictícios.
Certo dia, na Rua Augusta, em Lisboa, deparei com o ex-cabo enfermeiro, acompanhado da
presumível esposa e ladeados por duas lindas crianças louras. Ele reconheceu-me mas eu afastei-me para o outro lado da rua, ignorando-o.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

...a caminho sabia-se lá do quê !




Comovo-me sempre que assisto, através da televisão, à despedida daqueles rapazes que partem para integrarem forças militares internacionais em missão de paz num qualquer ponto do globo em guerra. Contudo, constato que as suas comissões de serviço são extremamente curtas e bem remuneradas. Além disso, possuem sofisticado equipamento electrónico, o que lhes permite falar e ver, à distância, os seus entes mais queridos, os seus amigos... E tornou-se numa moda o acompanhamento por parte de psicólogos (!!!)
No meu tempo a duração das comissões de serviço nas ex-colónias era, no mínimo, de dois longos e penosos anos. Correspondência só uma vez por semana, com notícias já ultrapassadas e por vezes mentirosas, a fim de evitarem ainda mais sofrimento...

O texto que abaixo transcrevo foi gentilmente publicado pela Sra Dra Laurinda Alves, na altura directora da Revista XIS-ideias para mudar (suplemento do Correio da Manhã).

...a caminho sabia-se lá do quê !

21 de Dezembro (faltam apenas três dias para o Natal)

17 horas:

Já a bordo do paquete Príncipe Perfeito e agarrado fortemente com a mão esquerda ao varão daquela imensa varanda navegante ia agitando no ar, com a mão direita, um lenço branco até me faltarem as forças nos membros e os olhos se encharcarem, acabando por deixar de ver aqueles que me eram mais queridos e lá ficaram, naquele cais de incertezas, apoiados uns nos outros, num sofrimento para o qual nunca haverá letras que consigam descrever...

22 horas:

Após a rápida refeição - trajando já à civil os cerca de oitenta militares que comigo embarcaram - a generalidade agrupou-se junto ao balcão do bar e uns beberam cerveja pelo gargalo da garrafa, depois de terem, com gesto premeditadamente rude, empurrado os copos com as costas da mão, outros despejaram raivosamente no esófago uísque com ou sem gelo, não importava, o que se pretendia era sentir rapidamente o efeito anestésico do acto... Até eu, que nunca bebia, acabei por me inebriar com alguns copos de uísque (lembro-me tão bem que se pagava apenas nove escudos e era do bom !). Depois, as alterações ao comportamento normalmente associadas a quem bebe demais surpreenderam-me: cada um se isolou a seu modo, apenas algumas lágrimas a escorrerem por entre as mãos que ocultavam as caras da dor. Foi nesse momento que saí, apressado, pensando estupidamente que podia voltar atrás, mas não... Transpor aquela porta levou-me apenas à parte exterior do navio, e dali avistei a proa que se mantinha num incessante baloiçar enquanto rasgava as águas a caminho sabia-se lá do quê !
Depois, um olhar desinteressado por aquele espectáculo a que assistia pela primeira vez:: a abóbada celeste completamente cravejada de estrelas, o reconhecer de que afinal a Terra sempre é como uma laranja, a julgar por aquele mar ali à volta, constantemente tão redondo...
Aquele permanente balançar; aquele ruído novo e estranho: a máquina, o mar e o vento misturavam-se - na primeira e inesquecível noite a bordo - com a música ambiente audível por toda a embarcação. Foi integralmente passada a 5ª. Sinfonia de Beethoven, logo seguida de um fado, provocando uma tal reacção psicológica a que nem o efeito do uísque havia de conter o choro: era, como por ironia, o fado que a minha saudosa avó Maria do Céu, a muito querida tia Margarida e a mais-que-tudo minha mãe cantavam baixinho enquanto me embalavam para adormecer. Da voz de Amália Rodrigues, envolvida no éter pelos gemidos de guitarras e violas ouvia-se: "Ai Mouraria / Da velha Rua da Palma / Onde eu um dia / Deixei presa a minha alma..."

I
Hoje, remexendo os trapos velhos,
achei no meu baú, empoeirados,
papéis de mel e fel: aerogramas.
Fiquei a tarde toda de joelhos
sonhando com aqueles tempos passados:
corações, corpos, sanzalas em chamas.

II
Navio lançando grito estridente
solidário com pai / mãe / namorada
/ mulher / filhos, todos os mais queridos;
um esvoaçar de lenços tão fremente
a barra que começa a ser passada
espuma de mar tragando tempos idos...

III

E cai do céu a noite, o mar é breu
e entra-me Beethoven pela alma
e oiço a voz de Amália, que saudade !
Já dorme no convés aquele que bebeu
com ar sereno, aparente calma
não querendo despertar p' ra realidade.

IV

Chegados a África, terra querida,
que em nada contribuiu para o terror
lá imposto não se sabe bem por quem,
começa-se a sentir aquela ferida
que lateja, purga, infecta em tanta dor
e a Morte a embrulhar o Zé-Ninguém.

V

A notícia tomba abrupta lá do ar:
a namorada / mulher foi infiel
traíu-o com o melhor companheiro;
é choro, é raiva, vontade de matar
fugir do acampamento ou do quartel
e deixar-se morrer prisioneiro.

VI

Ainda pior sina tem aquele
que através da notícia semanal
fica em estado de choque também;
abre o correio, não crê que seja dele
e confirma o recorte do jornal:
um acidente matou-lhe filho e mãe !

VII

Malvados há-os em todos os lados
a ocasião a fazer o vilão.
Chacina poupa preta linda e bela
e o último daqueles soldados
sacia a sua fome apontando então
a faca entre o peito dele e dela.

VIII

Aquele calendário tão comprido
de oitocentos dias, talvez mais
riscado com punho forte, devagar
acaba finalmente preenchido
e os distúrbios na mente são tais
que deixou de haver pressa em regressar.

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Já lá vai o tempo do "Currículo"... Espiritualista (estudioso, mas não fanático). Voluntariado