(Texto publicado no extinto JORNAL DA CHAMUSCA E DO VALE DO TEJO)
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UM SAXOFONE EM ÁFRICA
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UM SAXOFONE EM ÁFRICA
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Com catorze anos de idade fui admitido na empresa representante da Mercedes-Benz em Portugal, onde permaneci uma grande parte da minha vida: vinte anos. A Oficina de Camiões ficava situada onde agora é a Quinta das Larangeiras, num terreno contíguo à residência do Conde de Caria – representante das marcas comercializadas pelas firmas C. Santos, A. M. d’ Almeida e outras – e que se estendia daquela ponta do Jardim Zoológico até aos jardins do Hospital de Santa Maria.
Aquela oficina, para além de prestar assistência aos veículos comerciais das marcas Mercedes-Benz e Morris foi adaptada para se tornar numa autêntica linha de transformação e montagem das viaturas que ano após ano ganhavam os concursos que exigiam resistência e maneabilidade aliadas a um bom preço. As viaturas eram adjudicadas aos milhares e preparadas durante dia e noite : trabalhava-se em regime de laboração ininterrupta. Depois eram sujeitas a uma rodagem em estrada, quase sempre conduzidas pelos empregados da firma que assim ganhavam um dinheiro extra, passeando-as em caravana por todo o país, sobretudo aos fins-de- semana.
Todas as semanas, à Quarta-Feira, a praça de Sete-Rios transformava-se num enorme depósito de viaturas da cor da guerra prontas para serem embarcadas. Eram os jeeps, os Unimogs a gasolina e diesel e os camiões de cabina semi-avançada, de formas arredondadas. Durante anos passei as mãos por aqueles contornos e vincos acariciando-os, sempre pensando que um dia talvez nos encontrássemos lá em Angola, Guiné ou Moçambique...
De facto, assim aconteceu. Acabei por vir a encontrar-me com algumas daquelas viaturas no cenário de guerra. As conversas que tivemos são do foro íntimo, jamais alguém as entenderia se me atrevesse a descrevê-las...
Entretanto, alguns anos se haviam passado e, obviamente, na classe de camionetas a Mercedes foi perdendo favoritismo a favor da que viria a tornar-se numa das viaturas pesadas de guerra mais eficientes em terras de África : a Berliet.
De todas as viaturas militares que conheci a Berliet foi “a que me ficou mais no ouvido”.
É sabido que o som se propaga e adquire características muito próprias quando existe ar. Logicamente, entendo que em função da maior pureza ou da composição mais límpida desse ar o som possa ser diferente; atrever-me-ia mesmo a classificá-lo de "mais musical".
O ar no mato ou na chana em Angola, e curiosamente mesmo quando impregnado de pólvora, era diferente, era inebriantemente puro.
.Com catorze anos de idade fui admitido na empresa representante da Mercedes-Benz em Portugal, onde permaneci uma grande parte da minha vida: vinte anos. A Oficina de Camiões ficava situada onde agora é a Quinta das Larangeiras, num terreno contíguo à residência do Conde de Caria – representante das marcas comercializadas pelas firmas C. Santos, A. M. d’ Almeida e outras – e que se estendia daquela ponta do Jardim Zoológico até aos jardins do Hospital de Santa Maria.
Aquela oficina, para além de prestar assistência aos veículos comerciais das marcas Mercedes-Benz e Morris foi adaptada para se tornar numa autêntica linha de transformação e montagem das viaturas que ano após ano ganhavam os concursos que exigiam resistência e maneabilidade aliadas a um bom preço. As viaturas eram adjudicadas aos milhares e preparadas durante dia e noite : trabalhava-se em regime de laboração ininterrupta. Depois eram sujeitas a uma rodagem em estrada, quase sempre conduzidas pelos empregados da firma que assim ganhavam um dinheiro extra, passeando-as em caravana por todo o país, sobretudo aos fins-de- semana.
Todas as semanas, à Quarta-Feira, a praça de Sete-Rios transformava-se num enorme depósito de viaturas da cor da guerra prontas para serem embarcadas. Eram os jeeps, os Unimogs a gasolina e diesel e os camiões de cabina semi-avançada, de formas arredondadas. Durante anos passei as mãos por aqueles contornos e vincos acariciando-os, sempre pensando que um dia talvez nos encontrássemos lá em Angola, Guiné ou Moçambique...
De facto, assim aconteceu. Acabei por vir a encontrar-me com algumas daquelas viaturas no cenário de guerra. As conversas que tivemos são do foro íntimo, jamais alguém as entenderia se me atrevesse a descrevê-las...
Entretanto, alguns anos se haviam passado e, obviamente, na classe de camionetas a Mercedes foi perdendo favoritismo a favor da que viria a tornar-se numa das viaturas pesadas de guerra mais eficientes em terras de África : a Berliet.
De todas as viaturas militares que conheci a Berliet foi “a que me ficou mais no ouvido”.
É sabido que o som se propaga e adquire características muito próprias quando existe ar. Logicamente, entendo que em função da maior pureza ou da composição mais límpida desse ar o som possa ser diferente; atrever-me-ia mesmo a classificá-lo de "mais musical".
O ar no mato ou na chana em Angola, e curiosamente mesmo quando impregnado de pólvora, era diferente, era inebriantemente puro.
(O inconfundível saxofonista Fausto Papetti)
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Nunca me dei ao trabalho de estudar por que razão gostava do som do saxofone ou do trompete. Só sei que gostava e deliciava-me quando os escutava.
Assim como também nunca me esforcei por saber por que sempre associei o trabalhar do motor da Berliet ao som dum saxofone. Faz muitos anos que deixei de ouvir o arrancar e o desmultiplicar do motor duma Berliet militar, assim como deixei de me deliciar com o maravilhoso som do sax de Fausto Pappeti. Contudo, estão ambos sempre bem presentes martelando melodiosamente na minha memória.
Assim como também nunca me esforcei por saber por que sempre associei o trabalhar do motor da Berliet ao som dum saxofone. Faz muitos anos que deixei de ouvir o arrancar e o desmultiplicar do motor duma Berliet militar, assim como deixei de me deliciar com o maravilhoso som do sax de Fausto Pappeti. Contudo, estão ambos sempre bem presentes martelando melodiosamente na minha memória.
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